O tempo de uma fotografia Não era nem ontem
O tempo de uma fotografia
Não era nem ontem, e nós éramos um rostinho inocente posando para um retrato escolar.
Olhinhos apertados, espertos, ávidos por ver a vida crescer.
Crescemos nós.
Já no mundo adulto, aquela foto da escola perdeu-se em alguma caixa parda que guarda fotografias do tempo em que elas eram reveladas.
Eram aguardadas no suspense de seu conteúdo.
Havia prazer em esperar.
Fala-se disso:
_ As fotos ficaram boas? _ Vem aqui em casa pra ver! .
Diálogos dos século passado.O mundo adulto, hoje, é cheio de pressa.
Nem bem viveu-se algo, e esse algo já foi postado em alguma rede.
Desfruta de uns segundos de visibilidade, para depois perder-se, em memórias cibernéticas.
Será que as crianças de hoje ainda tiram fotos do tipo grupinho escolar? Todas as carinhas reunidas, professora do lado, e um fotógrafo gorducho mandando fazer xis.Não há muito tempo para esperas e aguardos.
Hoje, é tudo para hoje.
Será que no meio de tanta aceleração, dá tempo de se perguntar onde estarão aqueles meninos e meninas do nosso retrato escolar? Caminhos que nos engolem enquanto tentamos acrescentar alguns minutos à mais nas nossas horas corridas, e lá se foram os nossos primeiros melhores amigos.
A que se presta esta nostalgia? Serventia prática, nenhuma! Pensamentos miúdos não se prestam.
Eles prezam.
Prezam alguma coisa de valor que vai se perdendo pra não se perder tempo, e que podia ‘não’.
Podia-se não perder contato com as pessoas queridas.Podia-se responder os e-mails com muito mais palavras.Podia-se telefonar ao invés de encurtar tudo por sms.Podia-se ganhar da preguiça e chamar amigos pra um jantarzinho.Podia-se ultrapassar o tédio e organizar uma viagem.Podia-se fazer mais visitas, pra se ver ao vivo e à cores.Podia-se escrever uma carta, pra lembrar da própria caligrafia.Podia-se largar mão de artificialidades e conversar com mais vontade.Podia-se deixar pra lá a vaidade, e expor os sentimentos com mais verdade.Podia-se deixar o orgulho de lado e procurar reacender os afetos congelados.Podia-se dar um tempo aos formalismos das relações, e sair por aí, abraçando os outros,beijando os outros, olhando nos olhos dos outros…
Podia-se redescobrir aquele amigo, daquele tempo, e surpreender…
Em meio à tantas metas e prazos, a gente sabe que é na companhia do outro, na intenção e na atenção dedicados à amizade e ao encontro que a vida faz sentido.
Sem perder tempo com as miudezas que importam, perdemo-nos todos.
Perdidos e acelerados, periga que um dia, a gente não se ache mais.
‘Ultimamente têm passado muitos anos.’
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