O conto dos dois caminhos
O conto dos dois caminhos
Eu estava perdida em sofrimento, solidão e agonia.
Desejava tanto a morte quanto a luz do dia.
Já não sabia se amava mais a vida ou se desejava mais a morte.
Só que eu era covarde.
Tão covarde que eu não sabia viver e nem morrer.
Tinha medo da vida e da morte.
E eu vivia vazia, parada nessa encruzilhada.
Olhava para os dois caminhos, sem saber qual seguir.
Então peguei a direita, o caminho da vida.
Fiquei tão apreensiva que eu chegava a subir nos barrancos da vida, só para não entrar de cabeça nessa estrada.
Olhava para todos os cantos, todas as sombras… Eu prossegui pelo caminho da vida solitariamente.
Durante algum tempo… Mas, ao decorrer desse, eu encontrei outras pessoas nesse caminho.
Pessoas como eu.
Que também haviam parado na encruzilhada e que também haviam ficado indecisas.
Conheci um senhor que havia dito que havia conhecido um homem sofredor, como nós dois.
Esse homem optou pelo caminho da esquerda, o da morte.
E o senhor me disse que não sabia por quê.
E eu lhe disse que também não sabia.
Então nós rimos, aquele riso triste.
E então o senhor começou a narrar-me sua história de vida.
Disse-me que, quando tinha a minha idade, também havia chegado na primeira encruzilhada.
Nesse instante, arregalei os olhos.
E o senhor entendeu porquê.
E ele disse-me para não me assustar, pois no decorrer deste caminho eu hei de encontrar mais encruzilhadas como essa primeira.
E eu perguntei-lhe como ele sabia disso, sendo que nós dois estávamos apenas no início do caminho da vida.
Ele me disse que ele já não estrava mais no início.
Disse-me que havia nascido, prosseguido feliz e chegado à primeira das encruzilhadas.
Disse-me que passou pela vida e que a seguiu até encontrar outras tantas encruzilhadas, iguais à primeira.
E disse-me que, como eu podia observar, ele havia optado sempre pela vida, mesmo desejando também a morte.
Ele me disse que a única certeza que tinha nessa vida era que um dia ele teria de seguir o caminho da morte, mesmo querendo ou não.
E então ele me disse que não havia porque em apressar o fim, já que ele viria de qualquer jeito.
Ele me disse, então, que optou pela vida porque queria saber mais sobre ela.
Queria encontrar, no fim disso tudo, mais uma vez a alegria que sentia ao ser criança.
Perguntei como ele sabia que a encontraria.
Ele me disse que não sabia.
Perguntei, então, se ele havia encontrado.
Ele me disse que sim, mas que já à havia perdido.
Ao me ver com um olhar desentendido, ele disse à mim que havia encontrado o amor.
E então eu perguntei a ele por que ele havia voltado.
Ele me disse que não tinha mais o que viver.
Que sua vida já estava no fim e que jamais encontraria felicidade nessa, já que seu grande amor se fora.
Ele me disse que optou por voltar, apenas para narrar aos outros, como eu, suas histórias.
Disse também que queria terminar no início.
Que gostaria de morrer na primeira encruzilhada.
Que esperaria pela morte ali mesmo.
Disse-me que estava apenas voltando no tempo.
E disse-me também que queria prosseguir, antes que esse já não o deixasse mais fazê-lo.
Assim, o velho me disse um adeus e se foi.
E eu prossegui meu caminho, desejando, lá no fundo, encontrar a alegria.
Prossegui.
Após um tempo, encontrei um garotinho.
Estava escondido no meio do mato que crescia pelo barranco em que eu andava.
Ele se escondia da vida, mas ela não o deixava.
Perguntei a ele por que se escondia.
Ele me disse que era a vida quem se escondia dele, e não o contrário.
Ele me disse que a vida é que não quis ser gentil com ele.
Ele era tão pobre com um rato.
Era sujo e imundo.
Olhei para ele e disse-lhe que a vida também não me é gentil, mas eu não desisti de conquista-la.
Disse à ele para prosseguir que um dia daria certo.
Dei então um abraço bem forte no garoto sujo e prossegui.
Ao olhar para trás, vi que ele sorria.
Eu continuei andando.
O tempo passou.
Encontrei pelo caminho água, comida e ar fresco.
Encontrei o necessário para continuar vivendo.
Mas não encontrei a alegria que, lá atrás, aquele velho senhor dizia ter encontrado.
Eu, hoje, sou tão velha quanto ele.
Estou tão cansada que resolvi parar na próxima encruzilhada que me vier.
E farei a mesma coisa que fez aquele velho.
Vou ficar parada na encruzilhada, pensando na vida e na morte.
Esperando-a chegar.
Pensando em como fui feliz antes da primeira encruzilhada.
Tudo porque eu tinha conhecido a alegria que um dia aquele velho sentiu.
Eu só não dei a sorte que ele deu.
Eu apenas vi a alegria andando ao longe, já o velho pode abraça-la.
Ele pode amar e ser amado.
Já eu, parei na primeira parte, na primeira encruzilhada.
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